segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Velho Velho Oeste

Agora eu aqui, sentado nessa varanda, o sol se pondo ao fundo da minha cena, enquanto termino minha caneca de cerveja, enquanto o resto do mundo termina comigo. Tudo isso porque me acheguei nessa cidade, quase uma vila, quase uma cidade fantasma, há algumas horas, em busca de novo pouso, de novos ares, de algo novo, enfim.
Precisava de uma boa caneca de cerveja escura, pra refrescar o pó da estrada nas minhas roupas, nas minhas velhas botas, levantado pelo rolar das minhas velhas esporas, pelos cascos do meu velho cavalo. Entrei naquele saloon, sedento por algo novo, por novos olhares e, claro, por uma boa cerveja. Estava bem cheio àquela hora. Igual a todos os outros pelos quais eu houvera passado. Pra quem esperava coisas novas, em uma nova cidade, me pareciam as mesmas velhas coisas. Mas eu havia acabado de chegar.
Fui ter com o velho Mac Joe, o taberneiro. Estava lá, com seus velhos longos bigodes, seu velho avental, atrás do velho balcão, atendendo a velhos clientes. Mas tinha algo novo nele. Infelizmente, ele fechou antes que eu pudesse descobrir o que era. Mas os olhares... Ah, aqueles olhares, os mesmo velhos olhares, lançados sobre um estranho forasteiro, acabado de chegar de uma longa viagem, cansado das mesmas velhas coisas, saído de algum velho conto de faroeste, que nunca mudava. Ah, velho oeste.
Estava tranquilamente a tomar minha cerveja - que parecia a mesma velha cerveja de sempre -, e não pude deixar de ouvir as conversas ao meu redor. Parecia que o velho Jack Botas Sujas estava de volta à cidade. Matador de aluguel, velho carniceiro. Estremeço só de ouvir seu nome, e saber que está por estas redondezas. É o mesmo velho tremor, mas logo me acalmo. Penso comigo mesmo que, por ser uma cidade nova, John Mac Jones, o velho xerife, logo poria ordem na situação. Mas a cidade parecia uma velha cidade fantasma e o xerife uma alma penada, vagando por aí, mascando seu fumo, mofando sob seu velho chapéu de couro cru, mais ensebado que sua longa barba.
Nesta velha cidade, nada, enfim, me parecia mais tão novo. Acabei por me apaixonar - mesmo em tão pouco tempo por aqui - pela bela moça da cidade, Mary Ann. Apareceu na taberna - saloon, taberna, bodega, tanto fazia -, como um belíssimo raio de sol naquele lugar escuro e poeirento. Não me surpreendi ao perceber que todos os olhares de todos aqueles velhos homens voltaram-se para ela, e murmurinhos se ouvia. Achei por bem, forasteiro que era e homem destemido, oferecer “uma dose do que a moça for tomar, por minha conta”. Me arrependi logo após isso, ao ouvir do velho Mac Joe que a moça era noiva do Joe Quatro Olhos. Nome estranho pra um sujeito que tinha apenas um, arrancado a força de faca. Depois de tantas explicações, retirei minha gentileza. Destemido que sou.
Em um canto daquele lugar sujo, uma mesa estava rodeada por homens de olhares furtivos, misteriosos, jogando cartas com uma das mãos e a outra no coldre. Estavam ali - vim a saber depois - o velho Joe Cartas Na Manga, Abe Olho Vivo, Billy Boca Seca, Jimi Dedos Rápidos e Moe MacPerson. Após alguns poucos momentos de jogo, e servidas doses de Jack Daniel’s, ameaçaram uma pequena confusão. Todos já com os dedos nos gatilhos, prontos pra jogar mesa com cartas e copos pra cima. Alguma coisa a ver com “jogo de cartas marcadas”. Não fosse o velho Mac Joe intervir, com um tiro pro alto, a coisa teria ficado feia. Ele tinha qualquer coisa de diferente, juro! Mas, realmente, não tive tempo de saber o quê.



Cidade fantasma. As mesmas velhas coisas, os mesmos velhos tipos. E eu, o mesmo velho forasteiro, como na cidade anterior, e na outra, e na outra... Agora, com o sol já sumido no fundo do meu cenário perfeito, penso que entrei aqui a procura de uma nova cidade, de novas perspectivas, mas com a mesma velha expectativa. Talvez tenha sido esse o problema. As minhas expectativas deveriam, antes de qualquer coisa que eu procurasse, serem novas. Termino minha caneca de cerveja, e monto meu velho pangaré, pra cruzar novamente esse velho e nada amigável deserto. Agora com outro ideal na cabeça. Sei que o velho Mac Joe tinha qualquer coisa de novo, não sei o quê. Cavalgo em direção ao mesmo velho sol, no intocável e impassível horizonte. E, por mais velha que essa cena me pareça, é pra mim a cena perfeita, onde eu sempre deverei estar.
E afinal, não adianta procurar muito. Esse sempre será o mesmo e velho oeste, parceiro.

Um comentário:

  1. Da pra ver o desenrolar de cada cena... é ilustrativo, é visual...

    eu gosto!

    =)

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