quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Bar do Zé

-Zé! Mais uma pra nós!
O pedido se sobressai no meio do barulho, entre vozes e sons de garrafas, copos e tais. Estranhamente ela age como líder, e todos, inclusive homens, se divertem muito com isso. Ela gesticula, fala alto, se impõe. Demonstra serenidade e tem os olhos muito vivos. É como inclusive, se mantivesse a ordem no caos. Pensariam duas vezes antes de beber, se ela por acaso resolvesse dizer a eles o quanto seria melhor para suas vidas. É claro, isso não quer dizer que deixariam de beber. Mas pelo menos pensariam antes. E, sinceramente, talvez ela nunca fizesse isso.
Mas ela certamente tentaria se pensasse sobre o assunto. Testar as pessoas se tornou um hábito, e até um vício em sua vida. Diverte-se em ver como agirão os outros em relação ao que ela fizer, sempre esperando, claro, não que eles necessariamente ajam em benefício dela. Só que ajam. Sempre achou que as pessoas deveriam viver em benefício próprio, rindo de qualquer situação, agindo com vida própria. Não que isso signifique deixar o resto do mundo de lado. Sempre teve muitos amigos, bons amigos. Sabe que com o seu senso apurado de comunicação, seus cabelos vermelhos e seu rosto angelical pode conseguir o que quiser.

-Pois eu tenho muita pena de vocês!
Todos, mais uma vez, calam-se para que ela fale.
 -É isso mesmo, seu bando inútil e ignóbil de montes de carne envoltos em embalagem de poliéster! Todos bem aqui, sentados e bebendo sua própria vida em copos sujos de vidro não temperado! E o pior, ainda que os copos fossem de plástico barato não faria diferença para vocês, afinal o que importa mesmo é acabar com sua existência vã, gastando-a em alguns inválidos minutos nesta mesa de bar, ou de qualquer outra! Mas se acham que a vida termina aqui, estão muito enganados. Ela na verdade começará muito pior amanhã, e depois, e depois... E se ainda assim quiserem que ela continue boa como está, não se preocupem! O Zé ainda não fechou.
Toda a mesa irrompe numa gargalhada que ela reforça batendo palmas com força. Eles sabem que quando seu inflamado discurso difamatório começa, sua noite está terminando.
-Portanto, não o deixe em paz até ele chamar a polícia para tirá-los daqui. Tchau, pessoal!
Ela se levanta e vai. Ainda rindo de toda a situação, permanecem um tempo incrédulos de que ela tenha realmente ido embora. Sabem perfeitamente que isso geralmente significa mais duas cervejas no máximo. Sempre ficam um pouco melancólicos quando ela se vai, como se fosse a dona da bola. E ela é.

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