sábado, 15 de outubro de 2011

Outro Dia De Noite


      Sinto, enfim, que começa a acabar. Que ela começa a ir embora para o seu refúgio sabe-se lá onde, num esconderijo misterioso, fantástico, etéreo e onírico, como vislumbra o meu devanear, agora solitário. Talvez como sempre. Acho que não é mais assim que ela gosta de mim, mas era como eu gostava de estar com ela, mesmo quando ela se ia embora. Ainda assim, nessa melancolia velada que me faz gritar comigo mesmo ao pé do ouvido me obrigando a regurgitar tudo nestas linhas, gosto de pensar que ela nunca se vai, nunca se foi de verdade. Sempre assim, tudo estava claro, de repente dava-se lugar a ela, que reinava insone, mesmo que os outros dormindo estivessem. Parecia, parece e sempre vai parecer velar por tudo aqui embaixo, enquanto cobre a tudo, complacente, com seu manto. Não pediu, não pede e nunca pedirá permissão para isso. Mas, por horas que parecem não acabar, soberana permanece. De repente, como que pedindo licença, outro toma o seu lugar. E aos poucos se vai, mas deixando uma marca, como um aviso, um ponto brilhante aqui, um olho que nunca se fecha, azul desvanecido do outro, de que mais tarde está de volta. Que na verdade o fim de alguma coisa sempre foi, ainda é e sempre será simplesmente o começo de alguma outra coisa, ou de tudo de novo. E ela volta. E como volta! Mas como volta, se ela na verdade nunca se vai?
(...)
      Aqui dentro. É, bem aqui dentro que ela está. Sempre esteve, sempre está e sempre estará. Por vezes me angustia, porque sei que, no fim do novo começo de tudo, ela vai se esconder, sabe-se lá porquê. Estranho que essa angústia tem se tornado constante, sem dó. E eu tento e tento me livrar da noite, fazê-la sair de mim. Mas ainda aguento, e aguento. E no fim de tudo que será novo começo, me pego a balbuciar à ela "pode apertar mais um pouco. Quando  doer eu paro". E ela ri da minha cara.



Thiago Cruz, 15 de Outubro, 2011.



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