sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Desse Quarto (do Mundo Amarelo)


      Aqui nesse quarto tudo me parece tão fosco, tão fora de foco. Inóspito e inócuo. As paredes riscadas, manchadas de coisas do tempo, desse tempo e de outros, tempos e coisas. Em pé, parada ali na parede fica ela, que não me vê, não me olha com olhos de enxergar, entende? Fica ali, e quem a olha sou eu. A observo com olhos que um dia hão de serem comidos. Mas por enquanto quem a devora sou eu, pensando no que ela é, no que significa pra mim e pra tudo, pra todos. Não parece significar algo, de verdade. Parece de alguma forma zombar de mim. Ela fica parada, não faz nada. E eu quero tudo, fazer e pensar e ver e falar. Escutar, é o que mais me dói, eu acho. E disso ela nunca vai saber. Tudo aqui, inclusive ela, me parece tão meu. Tão amarelo. Tão meu.
      Fico aqui imaginando até onde vai tudo que vai aqui dentro de mim. Até onde vão meus devaneios, meus inquietos pensamentos. Será que podem ir além dessas paredes que me  aprisionam? Será que ela também pode ir além? Até onde? Como? Até quando? Ela não me diz e se faz de rogada, e parece me rogar praga, pra que eu fique aprisionado a ela, também.
      Eu que sempre me quis mais do que a qualquer coisa, não posso me livrar dela. Mesmo que não a queira. Mesmo que ela não me queira. Agora sim começo a entender até onde posso ir além dessas paredes manchadas, mofadas e amarelas.
      Me levanto e vou em sua direção. Ela se vira e é como se viesse à mim, também. Fico parado, olhando. Vendo como meus pés se encaixam perfeitamente nos seus. Como nossas existências se encaixam tão perfeitamente. Ela bem que poderia fazer alguma coisa. Me dar um sinal, um sinal de que não estou só neste quarto. Um sinal de até onde podemos ir juntos. E de repente a vejo erguendo a mão até mim, num cumprimento. Aperto-lhe a mão. E percebo que quem levantou a mão fui eu mesmo. Ela não se importa. Parece não se importar. Então,  penso num modo de afasta-la. Viro as costas e começo a caminhar na direção da janela. Ela também se vira e vai se fundindo a parede. Essa parede tão riscada, tão amarela. Tão minha. Agora sei até onde posso ir. Tento um vôo da minha janela, e não mais vejo minha sombra.
      Aquele quarto, que era tão amarelo. Tão meu.




                                                                                     Thiago Cruz, 14 de Outubro, 2011.
                                                                                     E vai o Mundo Amarelo de Marina...

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